É necessário perceber a angústia como um pano de fundo de todas as nossas escolhas
Talvez todos nós já tenhamos vivenciado, ainda que por um breve momento,
uma sensação de completo esvaziamento de sentido em nossas vidas. Um
sentimento indefinido pelo qual somos acometidos e ao qual não
conseguimos dar qualquer tipo de significado, uma vez que implica,
justamente, na ausência de todo ele.
Esse sentimento por vezes difuso, apesar de incômodo, parece nos alertar
sobre algo que está fora do eixo em nossa vida, convidando-nos a
reavaliar as escolhas que, por fim, nos conduziram até o momento atual:
como uma aparente incoerência entre a vida que se leva e a vida que se
espera.
Mas, afinal, o que poderia haver de errado quando se está dentro daquilo
que socialmente aceitamos como um modelo de vida estável, ou
bem-sucedido?
Fuga de nós mesmos
Na correria do dia a dia, somos quase impelidos a não entrar em contato
com as coisas que realmente nos incomodam; tudo mais parece prioridade,
como se as atividades do cotidiano fizessem parte de um grande estoque
de conveniências que utilizamos como forma de ocultar uma angústia
latente que a todo tempo está buscando por onde se fazer dizer. Eis aqui
o risco da inautenticidade, pois é precisamente no não enfrentamento
dos problemas pessoais que acabamos optando por escolhas mais fáceis, de
resultados rápidos e que, por consequência, hão de nos proporcionar um
comodismo ilusório e temporário.
Antes de falarmos de uma situação de vazio existencial, é necessário
percebermos a angústia não como um sentimento de dor, ansiedade ou
aflição, mas como sendo ela mesma o pano de fundo que está por trás de
todas as nossas escolhas.
Será, portanto, provável cair na angústia enquanto essas escolhas não
forem pautadas em um modelo de autenticidade bem definido, com espaço
para reflexão e discernimento daquilo que de fato faz sentido em nossa
vida. Nesse aspecto, a autonomia não se aplica somente ao mero conceito
de independência, mas antes, à condição de escolher por aquilo em que se
acredita, tendo de arcar com as responsabilidades que resultam dessas
mesmas escolhas.
Mantenha o foco
Constantemente somos norteados por formas de vida inautênticas, ou seja,
propagandas que supostamente nos mostram um ideal de felicidade mais
assertivo, compartilhado entre as pessoas de modo geral. Em meio a
tantas promessas de status e sucesso fica difícil administrar nossos
reais interesses considerando as imposições de um mundo que, por vezes,
parece apenas distanciar-nos de nossas metas.
Vale lembrar que no decorrer de uma meta existem fases transitórias que
nem sempre estarão de acordo com nossas expectativas, mas, uma vez
pautados em um propósito, encontramos formas de dar sentido ao trajeto
como um todo. É, para tanto, de essencial importância a questão da
ressignificação do que já foi vivido, uma vez que rejeita a hipótese de
um passado puramente determinista, oferecendo novas possibilidades de
compreensão sobre uma história repleta de significados negativos, como
no exemplo do professor que na infância parecia chato e exigente e, de
repente, passa a ser visto como alguém que teve contribuição
significativa no sucesso acadêmico.
Poderia mesmo se dizer que, quanto maior a diversidade de nossas
vivências, maior tenderá a ser nossa flexibilidade e desenvoltura frente
a uma situação opressora.
Estamos tão acostumados a olhar o ser humano como mero “produto do meio”
que nem ao menos percebemos como, desde sempre, somos impulsionados por
um movimento constante que compreende desde a forma como interpretamos
nossas lembranças mais remotas até o modo como projetamos nossos sonhos
mais distantes. Assim é o homem contemporâneo, tendo de se readequar
diariamente à sua realidade na medida em que constrói significados que
lhe permitam viver apesar de sua angústia em potencial.
Tempos modernos
Nessa época em que a velocidade de informação e tecnologia tornou-se tal
que parece haver ultrapassado o ritmo das pessoas, é necessário um
olhar mais profundo e soberano para nós mesmos, um silenciar de todas as
coisas a fim de ouvir a voz interior que tanto clama por ser ouvida.
Quando buscamos nos enquadrar aos requisitos de um padrão social eleito
pela maioria, sem um mínimo de questionamento, podemos estar
reproduzindo um modelo de normalidade esteticamente atraente, mas que
não se sustenta tão bem na prática da vivência.
A angústia nesse aspecto poderia ser mais bem representada como o “puxão
do tapete”, ou ainda, o momento em que nos deparamos com a existência
nua e crua, sendo obrigados a olhar para nossos próprios medos e
desejos: enfim, todas aquelas questões com as quais teremos de nos
reaver mais cedo ou mais tarde!
Podemos, portanto, concluir que é perfeitamente possível fazer uma
leitura otimista com relação ao sentimento de vazio existencial, uma vez
compreendido como forma de manifestação de nossos sentimentos mais
íntimos, por vezes abafados em meio à turbulência do mundo moderno.
De modo inexorável, esse estranho sentimento e a sensação de ausência de
sentido vêm denunciar as incongruências de uma vida inautêntica, regida
por escolhas induzidas e que muitas vezes não dizem respeito aos nossos
reais interesses de vida, arrancando-nos de uma condição de conforto e
comodismo para lembrar-nos que o ser humano não se angustia, ele é em si
a própria angústia.
(fonte:www.namu.com.br)
Fraternos Abraços